Nº 51 - Revista Economistas - Março

A economia feminista irá se colocar como uma contraposição à economia dominante, substituindo a racionalidade econômica pelo que é necessário para a sustentabilidade da vida humana, enfatizando o processo social e as interações sociais e as relações que daí surgem. Ou seja, os resultados materiais são consequência da divisão social entre todos os seus membros e não da maximização dos resultados alcançados pela ação de indivíduos racionais em busca de utilidades (como preconizam os neoclássicos). Neste sentido, a economia feminista procura abarcar todos os campos de estudo da economia e se coloca o desafio de enfrentar algumas questões centrais que representem práticas científicas e que incorporem preocupações como o tema da igualdade salarial no mercado de trabalho, as diversas formas de trabalho, a distribuição do trabalho reprodutivo, medidas que ajudem a medir o trabalho doméstico não remunerado e as discriminações que as mulheres enfrentam em estruturas ocupacionais e setoriais segmentadas, questões desprezadas pela economia predominante. Esse é um dos propósitos da economia feminista: revelar esses efeitos perversos e essas relações desiguais de poder e desmistificar a neutralidade da economia tradicional. Além disso, ela também se propõe a desenvolver novas perspectivas e novas formas de ver o mundo social e econômico que permitam tornar visível o que tradicionalmente a economia predominante não revela. O campo dos debates feministas vai se desenvolver com uma contribuição decisiva sobre

as relações sociais de sexo e o entendimento do trabalho como estruturador das relações sociais. Nesta elaboração, os trabalhos desenvolvidos e inspirados por Danièle Kergoat e Helena Hirata têm papel primordial, com a centralidade do trabalho e a compreensão da divisão sexual do trabalho na construção das relações sociais entre mulheres e homens. E, ao mesmo tempo, com a abordagem que denominou de “consubstancialidade das relações sociais”, imbricando as relações sociais de sexo, de classe e de raça (KERGOAT, 2009 e 2014), a elaboração feminista nesta área buscará responder aos novos desafios teóricos a partir dos anos 1990, trazidos, em grande parte, mas não apenas, pela exigência de abordar as relações raciais e responder aos debates relacionados à orientação sexual (HIRATA, 2017). Os efeitos de tornar invisível o trabalho doméstico e de cuidados e de transferir para as mulheres os custos de reprodução são vistos pela forma como as mulheres se inserem no mundo produtivo e pela necessidade de desenvolver estratégias que permitem sobreviver nestas duas esferas. As mulheres são forçadas a ingressar no mercado de trabalho em piores condições e aceitar ocupações que pagam menos. As tentativas de naturalizar essas relações aparecem nos paradigmas neoclássicos e uma contraposição a estas abordagens ganha visibilidade entre as feministas marxistas e, mais tarde, entre as economistas feministas. Mesmo considerando que as demais escolas econômicas negligenciaram a perspectiva de gênero em suas teorias, partimos da crítica à

A economia feminista irá se colocar como uma contraposição à economia dominante, substituindo a racionalidade econômica pelo que é necessário para a sustentabilidade da vida humana, enfatizando o processo social e as interações sociais e as relações que daí surgem."

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