Nº 51 - Revista Economistas - Março

RE: No início de março foi divulgado o PIB brasileiro de 2023, com um crescimento da ordem de 2,9%. Como você vê a importância deste número para a economia brasileira? JF: É um resultado expressivo, bem maior que as primeiras estimativas do mercado e precisa ser comemorado. A economia brasileira cresceu absorvendo mão de obra, reduzindo a taxa de desemprego, aumentando a massa salarial, com redução da inflação e valorização do real, mas ainda apontando os dilemas estruturais da economia brasileira, ou seja, crescendo sem uma mudança produtiva substantiva. É um crescimento, em boa medida, sustentado ainda no setor externo, no agronegócio e no consumo das famílias, o que tem fôlego curto. RE: Nos últimos dois anos o crescimento se acomodou em torno de 3%. Seria este o novo normal? E qual seria o nosso potencial de crescimento, especialmente depois de ter passado por um período de estagnação que vem desde 2014? JF: Não acho que este vá ser o novo normal. Há um conjunto de elementos que não devem se repetir em 2024, inclusive os gastos do governo vão estar mais comprimidos, mas também significa que se superou o pessimismo quanto ao que seria o primeiro ano do terceiro governo Lula. Havia um pessimismo quanto ao aumento dos gastos públicos, que levaria a um aumento da inflação que, para ser corrigido, demandaria um aumento substancial dos juros, comprimindo o investimento. E nada disso aconteceu.

RE: Vários indicadores econômicos têm apresentado resultados expressivos. O desemprego está no nível mais baixo desde 2014 e a balança comercial teve um superavit de quase US$ 100 bilhões em 2023. Na sua avaliação, qual é a maior trava para o crescimento econômico brasileiro? JF: Em primeiro lugar, a trava fiscal. O arcabouço fiscal limita os gastos discricionários do Estado, que não pode mais manejar a política fiscal com objetivos de curto ou longo prazo levando em conta uma análise mais minuciosa do cenário real. Os governos anteriores deixaram heranças, e elas podem ser materiais e objetivas, mas também ideológicas. O teto de gastos não deixou apenas a existência de uma regra que limitou os gastos públicos, mas a herança ideológica de que os gastos públicos precisam ser controlados por lei. Este é um rebaixamento do que era anteriormente a organização da política fiscal do Estado, quando não havia uma lei, mas um conjunto de acordos tácitos entre o Executivo e o Legislativo, e o Executivo mandava uma peça orçamentária com uma meta de resultado primário, levando em conta a estimativa de arrecadação e de despesas. Hoje a meta de resultado primário está numa lei e não permite mais a ação discricionária do Estado. Nós perdemos um instrumento, não por responsabilidade deste ou daquele governo, mas da sociedade – inclusive nossa, como economistas, que não conseguimos travar este debate com qualidade suficiente e massificá-lo de forma consistente para ganhar adesão e mudar a correlação de forças para que fosse possível descartar o teto de gastos e, no seu

O arcabouço fiscal limita os gastos discricionários do Estado, que não pode mais manejar a política fiscal com objetivos de curto ou longo prazo levando em conta uma análise mais minuciosa do cenário real."

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