Dicionário Enciclopédico de Psicanálise da IPA

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Gradualmente a ideia de enactment foi sendo mais usada e debates sobre o tema tornaram-se mais frequentes na literatura psicanalítica (McLaughlin 1991; Chused 1991; Roughton 1993; McLaughlin & Johan 1992; Ellman & Moskovitz 1998; Panel 1999). Para alguns, o termo enactment simplesmente substituiu acting out , embora seja de recordar que acting out é o equivalente inglês da palavra alemã Agieren . Em alemão “er agiere es” é o original de “mas expressa-o pela actuação ou actua-o” (“o paciente não recorda coisa alguma do que esqueceu e reprimiu, mas expressa-o pela actuação ou actua-o” , Freud 1914, p.91) (NT: Utiliza-se aqui a tradução da Edição Standard Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, vol. 14, ed. Imago. Uma tradução alternativa é a de Paulo César de Souza, a partir do original alemão, em Freud - Obras Completas, vol. 10, Ed. Companhia das Letras, p.149: “(…) o analisando não recorda absolutamente o que foi esquecido e reprimido, mas sim o actua. Ele não o reproduz como lembrança, mas como acto, ele o repete, naturalmente sem saber que o faz.”) Nalgumas culturas psicanalíticas, o temo acting out começou por referir-se a actos mais ou menos ocasionais e impulsivos que interferiam com a associação livre esperada, restringindo-se assim o conceito de Agieren . Simultaneamente, o termo veio a ser utilizado para rotular comportamentos de personalidades impulsivas e psicopáticas. As conotações moralistas de acting out contaminaram a linguagem de profissionais de saúde mental e da área jurídica. A substituição daquele termo por enactment tinha como objectivo eliminar a confusão conceptual e os aspectos pejorativos do termo. Existe uma conotação legal do termo enactment como uma lei, um mandato, um decreto, uma ordem que deve ser obedecida – a qual foi também tida em conta. O conceito psicanalítico incluiu ambos os sentidos do termo. Houve também o facto de que, por definição, os membros da díade participam num enactment e não estão suficientemente conscientes daquilo que está a acontecer. O analista é conduzido pela relação, sujeito às suas próprias questões internas e pontos cegos. Por contraste, no acting out as descargas do paciente podem ser observadas pelo analista, na medida em que ele não se permite envolver-se nelas. Muitos analistas descreveram situações similares àquelas que nós consideramos enactments , mas sem as nomearem com esse termo. O conceito possibilitou reunir vários fenómenos que tinham estado associados em Freud e elaborados por psicanalistas de diversas orientações teóricas, através de termos como repetição , revivência , externalização , acting-out , etc. O termo tornou-se gradualmente parte do corpo comum de conceitos psicanalíticos. Discussões e Estudo recentes podem ser visto em Paz (2007), Ivey (2008), Mann e Cunningham (2009), Borensztejn (2009), Stern (20110), Waska (2011), Cassorla (2012), Sapisochin (2013), Bohleber et al. (2013) e Katz (2014). Os enactments variam em qualidade e intensidade devido aos diferentes graus de déficit ou dano na capacidade de simbolizar. Os mais benignos podem ser “realizações” (Sandler, 1976) que gratificam desejos transferenciais em relação ao analista. Os mais malignos implicam a capacidade reduzida do analista, que leva a comportamentos de abuso da sua autoridade que ultrapassam os limites do que seria considerado tratamento analítico (Bateman 1998).

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