Dicionário Enciclopédico de Psicanálise da IPA

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A literatura psicanalítica debate se os enactments são prejudiciais ou se serão necessários e úteis. A tendência é considerar que os enactments surgem naturalmente quando um analista se defronta com configurações traumáticas, psicóticas ou borderline , mesmo quando os aspectos neuróticos predominam. São certamente úteis depois de terem sido compreendidos, e essa compreensão só pode vir depois de eles terem sido identificados, isto é, em modo de Nachträglichkeit (em après- coup ou de modo diferido). Enactments que não são devidamente identificados bloqueiam o processo analítico e podem destruí-lo. III. A. Evolução do Conceito na América do Norte: Influência da Escola Britânica das Relações Objectais A identificação projectiva é um elemento importante do enactment . Foi primeiro descrita por Klein (1946/1952), que a definiu como uma fantasia inconsciente consistindo em clivagem e projecção de partes boas e más do ego para dentro do objecto. Winnicott também utilizou o conceito. Bion (1962) expandiu o conceito, passando a incluir nele a comunicação pré-verbal e/ou pré-simbólica entre mãe e bebé. Ao conceito de Bion, Joseph (1992) juntou os comportamentos subtis mas activos do sujeito (acompanhados das respectivas manobras intrapsíquicas), que concorrem para criar um determinado ambiente na sala e evocar no ou na analista (o objecto) certas emoções, sensações e ideias que podem levá-lo(a) a adoptar comportamentos pouco habituais, mas que são mesmo assim consistentes com o esquema interno do analisando (sujeito). O’Shaughnessy (1992) descreve dois tipos de enactment , “enclaves” e “excursões”, que podem ter um potencial destrutivo para o processo analítico. O “enclave” resulta do analista fazer da análise um refúgio de toda a perturbação, e a “excursão” decorre do analista transformar a análise numa série de fugas. O’Shaughnessy reconhece que o acting out parcial ou limitado é uma parte inevitável de toda a situação clínica, mas torna-se problemático quando não é contido ao ponto de se deteriorar em enactments do tipo destrutivo – enclaves e excursões (Shaughnessy, 1992). Para além disso, os enactments podem ser vistos como um exemplo da ideia de Winnicott, atrás referida, de que nós temos sucesso falhando – falhando no caminho que o paciente deseja seguir. Esta perspectiva fica longe da teoria simplista da cura pela experiência correctiva. Parafraseando Winnicott, o enactment num paciente pode estar ao serviço do ego, se for acolhido pelo analista e usado de forma a permitir que o paciente traga algo de tóxico para a área que está sobre o seu controle, e na qual pode ser trabalhado através da projecção e introjecção. Assim, para a América do Norte, os conceitos de enactment têm raízes fundas em Freud e também na tradição das relações objectais.

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