Dicionário Enciclopédico de Psicanálise da IPA

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sucessivos. No entanto, ele evita as implicações econômicas do processo de après-coup sobre a real natureza do evento traumático que ele realiza graças ao seu trabalho regressivo; e ele apenas insiste no papel de sobredeterminação envolvido na cadeia verbal “pela ação retardada [ après coup ] em sua sequência” (1966 [1958], p. 532/2006, p. 446). Assim, está novamente no centro da causalidade Lacaniana como uma primazia concedida à temporalidade progressiva. A operação do après-coup é, portanto, uma reestruturação de eventos passados, uma ressubjetivização de um passado inconsciente, que se transcreve em uma formação do inconsciente. Mais tarde, Lacan apresentou a imagem do toro para exemplificar o processo de après-coup. A fala nas sessões transforma-se em digressões verbais tornadas necessárias pela presença neste toro de uma ruptura, uma lacuna, a divisão do próprio sujeito. Essas digressões verbais permitem que o toro se torne uma banda de Moëbius e uma mensagem expressável. A operação de après-coup é então representada por contorções, reviravoltas e inversões dessas digressões verbais. Lacan descreveu a causalidade psíquica da operação de après-coup “como sendo circular e não recíproca”, percebendo com precisão a dissimetria que existe entre as duas cenas II e I, bem como nas sessões entre os dois protagonistas. Jean Laplanche seguiu essa concepção integrando-a em sua teoria da sedução generalizada em que as mensagens maternas implantadas no inconsciente da criança continuam a produzir efeitos posteriores ou traduções sucessivas devido à força enigmática ligada à sua natureza sexual. A transferência se torna uma infinita “transferência da transferência". Toda a psicanálise francesa na segunda metade do século XX aproveitou o estímulo dado por Lacan. Muitos escritores franceses seguiram aprofundando a noção de après-coup (Le Guen, 1982; Laplanche, 1989-90; Chervet, 2006, 2009, 2010; André, 2009), ou utilizaram esse conceito em seus trabalhos sobre funcionamento psíquico, causalidade, temporalidade, etc. (Fain & Braunschweig, 1975; Fain, 1982; Green, 1982; Guillaumin, 1982; Faimberg, 1993, 1998; Neyraut, 1997). Várias conferências e volumes da revista psicanalítica francesa ‘Revue française de psychanalyse’ levaram “L’après coup” como tema (ver Revue Française de Psychanalyse 1982, 46, 3, “L'après-coup”; e, Revue Française de Psychanalyse 2006, 70, 3, “L’après-coup revisité”). A psicanálise francesa não tem dificuldade em se referir a esse conceito, muitas vezes limitando-o à sua definição temporal. III. B. Nachträglichkeit na Psicanálise Britânica e Europeia Seguindo a dinâmica emergência – desaparecimento – retorno, é útil enfatizar que o fenômeno do après-coup tornou-se um conceito xibolete entre a Psicanálise Francesa, Britânica e Americana. É notório que Melanie Klein e seus sucessores se interessaram mais particularmente pela primeira fase do evento traumático e nas experiências de medo e terror que o acompanham,

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