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Em outras análises, Nachträglichkeit toma uma posição central e é estabelecida uma hierarquia entre os termos com os quais está de acordo: cura, eficácia terapêutica, causalidade e significação. Nessas leituras, Nachträglichkeit assume densidade e complexidade maiores e mostra conexões com outros conceitos que difundem as características do processo primário. Leticia Glocer Fiorini (2006) enfatiza a coexistência de duas temporalidades distintas na obra de Freud: temporalidade progressiva e temporalidade retroativa. “Na obra de Freud, temporalidades evolutivas de movimentos progressivos, por exemplo, o desenvolvimento psicossexual de uma menina e um menino e suas metas desejáveis (Freud, 1925), coexistem com o conceito de temporalidade retroativa, que atribui significado a um ‘incidente traumático anterior’ a posteriori. A cronologia linear é assim desarticulada e o episódio significativo deve ser ressignificado (Freud, 1918)” (L. Glocer Fiorini, 2006, p.18) Ricardo Bernardi (1994) descreve os diferentes modos pelos quais as relações temporais podem ser encontradas na obra de Freud, modos que Freud não considera exclusivos. A) Um modelo em que o antes determina o depois. B) O modelo de Nachträglichkeit [que Bernardi traduz como a posteriori ] em que um evento anterior adquire novo significado e efeito psíquico posterior em virtude de ser modificado quando se torna parte de um novo contexto. C) O fenômeno da fantasia retrospectiva, Zuruckphanthasieren, que resulta em atribuir algo a um momento anterior que ocorre posterior a ele. Bernardi (1994) argumenta que é possível encontrar modificações no conceito de Nachträglichkeit quando Freud descobre a sexualidade infantil. Carlos M. Aslan (2006) destaca que a Nachträglichkeit é um modo como o aparelho funciona. Para Aslan, o termo é relevante para as experiências do dia-a-dia e não deve ser reduzido a sua relação com situações traumáticas. “Basta lembrar o conceito Freudiano de um mecanismo a posteriori que, como Blum observou, não é excepcional, mas habitual, e não restrito a situações traumáticas; [pode ocorrer em] experiências do dia-a-dia quando um efeito modificador se relaciona com o significado de um traço mnemônico [eventos estruturados anteriores]. Ela ocorre não na realidade material, mas sim na realidade psíquica histórica do sujeito. Uma vez estruturada, a [realidade psíquica histórica] influenciará a percepção e interpretação de novas experiências, e isso continuará de forma sucessiva. Dessa forma, não apenas novas estruturas são produzidas, mas, reiterando, estruturas anteriores são modificadas” (Aslan 2006, p. 71). Na mesma linha de Aslan, Madeleine Baranger , Willy Baranger e Jorge Mom (1987) argumentam que o a posteriori não recebeu importância adequada pelos leitores de Freud. Enfatizam a participação do conceito na constituição da fantasia, circunscrevendo o aspecto econômico do trauma. Um vestígio de um evento permanece na psique sem constituir
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