Dicionário Enciclopédico de Psicanálise da IPA

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Bleger, desenvolveu o conceito de “ setting encarnado”, particularmente em pacientes com transferência simbiótica. Ela apontou como a aparência física do analista age como um poderoso estímulo no mundo interno do paciente, e também como qualquer mudança no corpo do analista é sentida como profundamente desestabilizadora. Outros componentes do “contrato”, como honorários e períodos de férias, devem também ser incluídos como parte do setting externo. Quanto aos honorários, especialmente hoje em dia, o paciente pode vir a necessitar apoio financeiro de determinadas organizações, o que inevitavelmente implica na presença de um terceiro, um elemento que deve ser considerado no contrato inicial. Esse terceiro varia de acordo com os diferentes países: pode ser o National Health Service (NHS britânico), um seguro de saúde ou ainda, no caso de candidatos, a clínica psicanalítica de um instituto de psicanálise.

III. SETTING INTERNO

No que concerne ao setting interno do analista , as ideias principais são encontradas em Freud. O setting interno consiste em um estado mental de “não dirigir o reparo para algo específico” e de manter a mesma “atenção uniformemente suspensa [...] em face de tudo o que se escuta” [...] “a regra de prestar igual reparo a tudo constitui a contrapartida necessária da exigência feita ao paciente, de que comunique tudo o que lhe ocorre”. Mais ainda: o analista “deve conter todas as influências conscientes da sua capacidade de prestar atenção e abandonar-se inteiramente à ‘memória inconsciente’ [...] Ele deve simplesmente escutar e não se preocupar se está se lembrando de alguma coisa” (Freud, 1912, pp. 125-126). Essas reflexões são ainda válidas, mas houve grande aprofundamento delas, especialmente a partir das ideias de Bion de reverie . Bion define reverie como “aquele estado mental que é aberto à recepção de quaisquer ‘objetos’ do objeto amado e que é, portanto, capaz de receber as identificações projetivas da criança [do paciente], sejam elas sentidas pela criança [pelo paciente] como boas ou más” (Bion, 1962, p. 36) (N. do T.: Citação traduzida para esta edição). Outros componentes importantes do setting interno são a neutralidade e a abstinência. Laplanche e Pontalis definem neutralidade como uma atitude no analista de tentar ser “ neutro quanto aos valores religiosos, morais e sociais [...] neutro quanto às manifestações transferênciais” e neutro porque ele não deve, “privilegiar a priori , em função de preconceitos teóricos, um determinado fragmento ou um determinado tipo de significações.” (Laplanche e Pontalis, 1992 p. 318). Anna Freud definiu neutralidade em termos da necessidade do analista de se manter equidistante do ego, do superego e do id do paciente (1936). Laplanche e Pontalis definem abstinência da seguinte maneira: o analista “deve se recusar a satisfazer os pedidos do paciente e a preencher efetivamente os papéis que este tende a lhe impor.” (1992, p. 3) Freud discutiu os perigos do zelo terapêutico em seus trabalhos sobre técnica escritos entre 1911 e 1915, e descreveu a famosa analogia do analista agindo como um cirurgião. Essa

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