Retornar ao sumário
comparação é alvo de má interpretação e crítica quando tomada de forma literal (como na ideia do analista silencioso). Rycroft (1985) sublinhou o fato de que o analista não deve apenas dar interpretações “corretas”, mas também propiciar uma relação com seus pacientes na qual um processo analítico possa se desenvolver. Aron (2001) ressalta que a interação na análise é assimétrica. Uma assimetria é a seguinte: enquanto ambos participantes vão falhar na tentativa de manter o setting /enquadramento, o analista carrega a responsabilidade de restaurar o enquadramento através de análise. Isso parece ser uma questão tanto ética quanto metapsicológica, pertencente à tarefa e à função do analista. Neutralidade e abstinência são também a base da dimensão ética da atitude do analista frente a seu/sua paciente e a seu trabalho. Na ausência de uma genuína internalização dessas capacidades, as necessidades narcísicas do analista podem levar à exploração da vulnerabilidade do paciente. O estudo de violações éticas (Gabbard e Celenza, 2003) trouxe atenção à importância e ao significado da abstinência analítica e à necessidade incessante de que o analista monitore sua contratransferência. Embora o setting interno geralmente se refira ao analista, não há razão para não considerá-lo também no que diz respeito ao paciente . A especificidade da situação analítica encontra-se no desejo do paciente de permitir a livre expressão de fantasias, conflitos e afetos inconscientes e na capacidade do analista de compreender. Para que o paciente possa expressar suas fantasias inconscientes, é preciso um estado mental particular difícil de atingir, que torne aceitável o compromisso de tentar cumprir com a livre associação. De acordo com Freud, essa regra fundamental consiste em que os pacientes “evitem qualquer reflexão consciente e se abandonem, em um estado de concentração silenciosa, a seguir as ideias que lhe ocorrem espontaneamente (involuntariamente) [...] mesmo que sejam desagradáveis, muito indiscretas, muito banais ou irrelevantes” (Freud, 1924, p. 195). Muitos outros analistas exploraram e desenvolveram seu pensamento sobre a “atitude analítica” a partir do conceito de Winnicott de holding e de ambiente facilitador (Winnicott, 1965, Klauber, 1981, Bollas, 1987, Parsons 2014), no qual o analista oferece a si como um objeto a ser usado pelo paciente. Isso expandiu o campo de compreensão do processo analítico, incluindo a transferência, a contratransferência e a resposta afetiva do analista (King, 1978). J. Sandler (1976) descreveu o conceito de role responsiveness (N. do T.: essa expressão é geralmente mantida sem tradução na literatura psicanalítica de língua portuguesa) do analista, o qual se refere à capacidade do analista de identificar-se inconscientemente com um objeto interno pertencente ao paciente e envolver-se em um enactment na sessão. É apenas mais tarde que o analista se torna consciente do que ocorreu e é então capaz de formular uma interpretação referente ao significado na fantasia do que aconteceu. Esse tipo de enactment pode envolver o corpo do analista, em termos de comportamento ou de uma resposta corporal particular. Na psicanálise italiana (p.ex. Bolognini, Bonaminio, Chianese, Civitarese, Ferro), seguindo o trabalho de Winnicott e Bion, houve um desenvolvimento do pensar a respeito dos vários elementos da atitude analítica do analista. Isso expandiu a compreensão dos conceitos de contratransferência e construção, e levou ao foco na “pessoa do analista”, incluindo o corpo do analista. Bolognini explorou o tema da empatia psicanalítica (2004), que ele aloca em
277
Made with FlippingBook - Online catalogs