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O objeto está sempre no centro da vida emocional, desde os primórdios, assim como o é na situação de transferência, e os mecanismos de defesa estão, desde o início, indelevelmente ligados às relações objetais. A busca por objetos é considerada fundamental para Melanie Klein, constituindo um pré-requisito para a vida psíquica, enquanto que, para Freud, a satisfação dos impulsos independe da busca pelos objetos. Essas diferenças produzem uma profunda divergência em suas respectivas teorias da transferência: enquanto que, na visão de Freud, a transferência é baseada principalmente de impulsos que buscam descarga, e na reconstrução do passado, para Klein, a evolução da transferência se torna o centro das atenções. “[…] mudanças fundamentais resultam da análise consistente da transferência; estão ligadas a uma revisão de alcance profundo das primeiras relações de objeto e refletem-se na vida presente do paciente, bem como na modificação das atitudes em relação ao analista.” (Klein, 1952, p. 79). Klein não favorece interpretações do “aqui e agora” que estejam desconectadas do passado do paciente, mas reconhece que o paciente projeta um mundo interno determinado por experiências passadas sobre o analista e considera que a estrutura desse mundo interno evolui ao longo do processo do reviver transferencial. A descoberta dos mecanismos de cisão na década de 1920 permite que os psicanalistas conceituem como a transferência é experimentada pelos pacientes psicóticos: a divisão em bons e maus objetos, que domina a infância primitiva, leva diretamente à compreensão da transferência como a interconexão dos sentimentos positivos e negativos de amor e ódio. A interação dos vários aspectos dos objetos, para os quais essas emoções são dirigidas, instiga um círculo vicioso de agressão, ansiedade e culpa, que deve ser trabalhado repetidas vezes na transferência: “Na realidade, existem muito poucas pessoas na vida do bebezinho, mas ele as sente como um grande número de objetos, pois lhe aparecem sob diferentes aspectos.” (Klein, 1952, p. 77). Klein afirma que analisar a transferência negativa é uma pré-condição para que se obtenha acesso às camadas mais profundas da mente, embora as transferências positivas e negativas estejam sempre combinadas. Klein enfatiza a noção de fantasia inconsciente no aqui-e-agora da sessão. Eventos “reais” devem sempre ser considerados, segundo Klein, em sua interação com a vida inconsciente de fantasia do paciente. A definição de fantasia inconsciente de Klein (e de Susan Isaacs) estava no centro das Controvérsias (N.T.: Controversial Discussions no original), no início dos anos 40 e, de acordo com Elizabeth Bott-Spillius e Ron Britton, o uso das mesmas palavras para diferentes conceitos contribuiu para a intensidade do debate. Segundo a visão kleiniana, a fantasia inconsciente inclui todas as formas iniciais do pensamento infantil - é a mola principal da mente inconsciente e o representante psíquico dos impulsos, mas também inclui outras formas de pensamento que emergem mais tarde, através do desenvolvimento das fantasias originais. A transferência, nessa visão, é a experiência inconsciente no aqui-e-agora, mapeada, contudo, pelos mecanismos infantis com os quais o paciente manejou os seus conflitos, há muito tempo. A fantasia inconsciente influencia e colore a experiência da realidade e vice-versa. Melanie Klein defende a interpretação em termos de fantasias inconscientes, àquela em termos de impulso versus defesa. Como resultado, ela consistentemente interpretaria na transferência ao invés de interpretar a transferência em si.
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