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VII. COMENTÁRIOS FINAIS
Desde os modestos tempos iniciais de Freud, quando ele atribuiu um nome para um erro feito pela mente humana, a exploração multifacetada da transferência vem sendo designada, no próprio pensamento criativo de Freud e no de seus seguidores, como um dos aspectos mais desafiadores do pensamento psicanalítico e do trabalho clínico. Através da evolução da teoria psicanalítica, foram desenvolvidas diferentes conceitualizações a respeito das forças por trás do aspecto repetitivo da transferência e sobre a sua ativação no contexto interativo frente-a-frente ao analista. Enquanto tradicionalmente o deslocamento e/ou a projeção eram tidos como os mecanismos primários, através dos quais as paixões infantis e os conflitos em torno do mundo de objetos do self primitivo eram reproduzidos na transferência, o quadro foi se tornando cada vez mais complexo. Algumas teorias contemporâneas afirmam que, além da recriação de antigas relações de objeto, a transferência envolve uma busca por novos objetos do desenvolvimento e, ainda, que o fenômeno da transferência pode ser co-criado no interior de várias concepções dinâmicas do campo ou de outras concepções ‘triádicas’ e ou transicionais, ou também concepções dialéticas da interação analista-analisando. À medida em que se aprofunda o entendimento sobre as múltiplas conexões entre os processos nas interações intra e interpsíquicas, sobre as comunicações, os ‘papéis’ e as temporalidades no contexto do setting analítico, muitos autores de diferentes escolas de pensamento fizeram relatos poderosos, de importância clínica e teórica, das influências bidirecionais que circulam entre analista e analisando. O ‘par’, ‘díade’ ou ‘casal’ analítico tornou-se uma unidade preponderantemente importante para considerações clínicas e teóricas e a Transferência e sua contraparte, a Contratransferência, tornaram-se parceiros dinamicamente vinculados. Utiliza-se o mecanismo da ‘identificação projetiva’ como uma das muitas tentativas de nomear e explicar essas influências mútuas e bidirecionais. De modo semelhante, conceitos como “self-objeto” e ‘transferência de self-objeto’ falam da importância do entrelaçamento inseparável entre self e objeto, desde uma perspectiva teórica diferente. Dentro do arco ampliado da matriz da transferência-contratransferência, existe uma crescente ênfase nas questões da “representação” ou “representabilidade”, da experiência psíquica ou bio-psíquica e na compreensão do processo analítico como um todo, no qual a participação do analista ajuda o analisando a representar simbolicamente experiências prévias rudimentares e incapazes de serem representadas. Na América Latina, onde a tendência tem sido, historicamente, enfocar na definição de Transferência centrada na pessoa do analista, a teorização sobre a contratransferência aglutinou desenvolvimentos diversos. O conceito de experiência apresentado num campo intersubjetivo ampliou e aprofundou o estudo da diversidade de obstáculos e de ‘baluartes’ que aparecem no campo analítico. O surgimento de sensações, percepções, experiências ( Erlebnis) e ocorrências no analista, analisadas durante a sessão, que foram causadas por aquilo que não alcançou inscrição alguma e que sobreviveu em um constante presente (experiência ‘atual’) foi
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