ocorrem em diferentes fases da terapia psicanalítica, e as diferentes posições éticas sobre cada uma delas que podem ser tomadas por analistas de convicções teóricas distintas, não é viável para a IPA elaborar um procedimento padrão para a apresentação e publicação de material clínico que seria eticamente correto e generalizável para todos os analisandos. Nossa responsabilidade ética de proteger nossos pacientes e seu tratamento vai além das obrigações estritamente jurídicas. Mesmo quando o anonimato dos pacientes é respeitado para que eles não sejam reconhecíveis para os outros, seu autorreconhecimento pode ter repercussões angustiantes para suas visões de seus analistas, de si mesmos e dos tratamentos, sejam eles em andamento ou já concluídos. Devido a essas limitações em nossa capacidade de termos convicção sobre nossas escolhas éticas específicas, além de nossa responsabilidade ética como profissionais individuais, estamos propondo uma abordagem de “comunidade de interesse” (Glaser, 2002) na qual são incorporadas salvaguardas em vários pontos do processo de elaboração e apresentação de material clínico e todos os envolvidos são responsáveis pela sua efetividade. O objetivo é fomentar uma cultura de sigilo na qual a proteção da privacidade e da dignidade do paciente se torne uma preocupação primordial em todos os aspectos da elaboração, compartilhamento e apresentação de material clínico. 3.2 Reduzir o dano potencial e efetivo aos pacientes provocado pela necessidade científica, técnica e ética da profissão em compartilhar experiências clínicas A presença da vida mental inconsciente em todo ser humano, e sua intensa mobilização durante o tratamento tanto no analista quanto no paciente, em uma espiral mutuamente ativada e entrelaçada, torna impossível fingir que qualquer apresentação clínica seja exaustiva ou livre de esforços inconscientes desconhecidos da parte do autor. Além disso, o material clínico selecionado como objeto de uma apresentação é sempre, até certo ponto, uma construção criada pelo analista. Essa observação faz com que o compartilhamento de material clínico com pares ou supervisores seja tanto necessidade profissional como constante apelo à modéstia científica. É simplesmente impossível saber tudo o que podemos estar comunicando inconscientemente quando apresentamos nossos analisandos aos outros, seja por escrito ou oralmente. Também não podemos prever com segurança qual será o impacto sobre o analisando, imediatamente ou no futuro próximo ou distante, de descobrir que o analista escreveu sobre ele, quer tenha obtido permissão ou não. Portanto, somos obrigados a concluir que nossa responsabilidade ética é paradoxal: somos responsáveis pelo impacto em nossos pacientes de compartilharmos seu material clínico com outras pessoas, apesar de não podermos prever ou controlar totalmente esse impacto, nem mesmo saber quais aspectos dele podem ter escapado à nossa percepção. A tensão entre o sigilo e a necessidade do analista de compartilhar foi captada pela orientação jurídica encomendada pela IPA à advogada inglesa Anya Proops, QC. Por um lado, ela conclui que “em geral, é difícil ver como a divulgação de dados efetivamente anônimos equivaleria a um uso indevido de informações privadas em um sistema de direito
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