Relatório do Comitê de Sigilo da IPA

2.4 Possibilidade de conflito insolúvel entre necessidades ou pontos de vista contraditórios Podemos conceitualizar o sigilo como algo que diz respeito às nossas relações profissionais de pelo menos duas maneiras diferentes. Se pensarmos o sigilo exclusivamente em termos do relacionamento entre analista e analisando, a necessidade de o analisando poder confiar no analista para proteger o sigilo pode entrar em conflito com a necessidade ética e científica do analista de compartilhar material anônimo com os colegas para supervisão, ensino e publicação. Por outro lado, se pensarmos em sigilo nos termos de um relacionamento cuja qualidade e integridade exige desde o início a inclusão de colegas psicanalistas como terceiros com os quais o analista comunica material clínico “em confidência”, o analisando pode não compartilhar dessa visão; neste caso, pode surgir um conflito entre as concepções de sigilo do analista e do analisando. De qualquer forma, um conflito entre as visões do analista e do analisando pode ser insolúvel. 2.5 O sigilo como alicerce ético e técnico da psicanálise O princípio de que o sigilo é um dos alicerces da psicanálise não é apenas uma questão de ética, mas também de técnica psicanalítica; os aspectos éticos e técnicos são inseparáveis. Portanto, proteger o sigilo dos pacientes envolve a IPA em uma regulação ética da prática psicanalítica. O desafio para os analistas é que o objeto de nosso estudo – o inconsciente – é tanto parte de nosso ser como do de nossos pacientes, e igualmente provável que surja de formas inesperadas. Nosso desejo de proteger nossos pacientes pode ser solapado por esforços inconscientes de nós mesmos. É por este motivo que, neste relatório, lançar mão de uma escuta não julgadora por colegas antes da apresentação ou publicação de qualquer material clínico é considerado indispensável para detectar a excitação inconsciente despertada pelo processo. Porém, essa prática tem suas próprias armadilhas e limitações. 2.6 Sigilo e privacidade As palavras sigilo e privacidade são usadas de várias maneiras complexas em contextos cotidianos; muitas vezes se sobrepõem, e às vezes são confundidas. Para o propósito desta discussão, será útil distingui-los pensando que o sigilo surge sempre no contexto de um relacionamento, dentro do qual são compartilhados informações, experiências e sentimentos privados dentro de limites rígidos. Do ponto de vista jurídico, o sigilo é uma obrigação ética, enquanto a privacidade é um direito individual 1 . Manter a privacidade do que é comunicado entre analista e paciente é claramente uma condição necessária para o sigilo na análise. Isso se aplica independentemente de o sigilo como requisito ético ser encarado como incondicional ou sujeito a certas limitações ou exceções por motivos clínicos e/ou jurídicos. A menos que a privacidade de suas conversas

1 Vide p. ex. http://criminal.findlaw.com/criminal-rights/is-there-a-difference-between-confidentiality-and- privacy.html

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