Nº 48 - Regime Fiscal Sustentável

porque contém os gastos, ou seja, a demanda - que, dentro da visão heterodoxa, é o que estimula a produção e o emprego. Assim, o presidente Lula estava equivocado ao reclamar das pressões para cortes de gastos, dizendo que elas se deviam a uma teoria econômica desatualizada. Não se trata de desatualização, mas de teorias distintas e conflitantes: a que fundamenta o neoliberalismo e a que inspira o desenvolvimentismo. Em vista disso, a pior preocupação é: tais cortes podem garantir crescimento baixo e isso piora todas as propostas desenvolvimentistas. O crescimento menor da produção significa crescimento menor do emprego e da renda, dificultando muito a solução urgente da pobreza e do desemprego. A convivência com taxas elevadíssimas de juros em termos reais, como as atuais, amplia a concentração de renda que já era grande, vinha se reduzindo e começou a crescer novamente desde o início da austeridade fiscal. Com a taxa de juros alta, a dívida tenderá a crescer ainda mais, ampliando de novo as pressões para cortes de gastos, enquanto a arrecadação, com um PIB crescendo pouco, também deixa de crescer para fornecer alívio das próprias contas públicas. Assim, não apenas a sustentabilidade fiscal torna-se ameaçada, mas sobretudo se perde sustentabilidade social e econômica, colocando em risco o prometido desenvolvimento que deu suporte político à eleição do presidente Lula. A questão que não quer calar é: por que o mercado gostou do arcabouço fiscal, se ele inibe investimento e crescimento? Porque o mercado que aprovou não é o mercado que produz bens e serviços reais ou contribui para ele com emprego, ou demanda ou oferta de insumos. É o mercado financeiro, e nele não se trata de quem fornece crédito à produção real, mas dos que meramente especulam - ganham com taxas altas de juros da dívida pública ou com mera venda de ativos a preços maiores do que os de compra - sem que os recursos retornem à produção real via investimentos produtivos. Estes são os que, de fato, enriquecem com as políticas de austeridade fiscal. Trata-se, porém, tanto no Brasil como no exterior, do 1% mais rico das populações, a quem o neoliberalismo enriqueceu enormemente. Eles deveriam ter maior alíquota de imposto de renda, porque pagam menos do que os de renda mais baixa, e precisam pagar impostos sobre dividendos, porque não contribuem para o investimento e, como consequência, para o aumento da renda e do emprego e a solução da pobreza e da desigualdade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Krugman, P. (2012). End this Depression Now, W. W. Norton & Company:New York/London. Mollo, M. L. R. (2004). Ortodoxia e Heterodoxia Monetárias: a questão da neutralidade da moeda, Revista de Economia Política, vol. 24, nº 3 (95), julho-setembro. Lopes, M. L., Mollo, M. L. R. e Colbano, S. F. (2012). Metas de inflação, regra de Taylor e neutralidade da moeda: uma crítica pós-keynesiana, Revista de Economia Política, vol. 32, nº 2 (127), pp. 282-304, abril-junho.

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| REVISTA ECONOMISTAS | ABRIL A JUNHO DE 2023

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