Dicionário Enciclopédico de Psicanálise da IPA

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A terceira importante hipótese emerge, enquanto Freud investiga a representação do mundo no reino do inconsciente, distinguindo entre representação de coisa e representação de palavra. A proposta de diferenciação entre representações de palavras e de coisa foi o resultado de observações, as quais estavam além dos sonhos e das neuroses. “Só a análise de uma das afecções que denominamos de psiconeurose narcisista promete proporcionar-nos concepções através das quais o enigmático Ics ficará mais ao nosso alcance, tornando-se, por assim dizer, tangível” (Freud, 1915, p. 224). Na fala esquizofrênica, as palavras podem ser submetidas ao processo primário do inconsciente, se tornando concretas ou como coisas. Freud fez esta observação para explicar que, o que foi anteriormente descrito como uma apresentação consciente do objeto, deve ser diferenciado em representações de palavra e de coisa. A ideia consciente inclui a representação de coisa e a representação de palavra que pertence a ela, enquanto a representação inconsciente, com a sua qualidade alucinatória, é caracterizada apenas pela representação de coisa. Vale a pena notar a formulação alemã do que estamos a entender por representação de coisa: Freud fala de “Sachbesetzungen der Objekte” (catexia- coisa dos objetos) indicando que no inconsciente, não há distinção entre a coisa e a representação da coisa. Porém, não se pode, no estado de alerta da consciência focalizada, reproduzir a qualidade de coisa do inconsciente; só se pode esperar passivamente pelo seu surgimento. Neste período, Freud estava engajando ideias do período anterior em novos contextos e iniciando a desenvolver ideias, que só seriam totalmente sistematizadas na próxima etapa de seu desenvolvimento teórico. “O caso Dora: Fragmento de uma Análise de um Caso de Histeria” (Freud, 1905a), que forma uma ligação conceitual entre “A Interpretação dos Sonhos” e “Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade” no que diz respeito à sexualidade infantil, também é notável por sua atenção pioneira no fenômeno dinamicamente inconsciente da transferência . Em “Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade” (1905b), Freud explorou os estágios do desenvolvimento psicossexual e da sexualidade (inconsciente) infantil . A dificuldade para contornar a censura com o uso modificado da ambiguidade do processo primário e a liberação parcial dos impulsos instintuais nos chistes é investigado em “O Chiste e sua Relação com o Inconsciente” (1905c). Em “Totem e Tabu” (1912-1913), Freud discutiu a transformação da hostilidade inconsciente em afeição excessiva (p. 70), bem como a projeção inconsciente da hostilidade sobre o morto, como segue: "A hostilidade, da qual os sobreviventes... nada desejam saber, é expelida da percepção interna para o mundo externo... Não se pode dizer que estejam alegres por se haverem livrado do morto; pelo contrário, estão de luto por ele; mas... ele transformou- se num demônio perverso... ansioso por matá-los. Torna-se-lhes então necessário... aos sobreviventes, defender-se contra o inimigo malvado; aliviaram-se da pressão provinda de dentro, mas apenas a trocaram pela opressão vinda de fora" (pp. 84). O texto é uma excelente exposição dos esquemas filogenéticos que se manifestam através de fantasias originárias , como um dos conteúdos do inconsciente.

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